por Marcelo de Oliveira Souza

Uma breve história da radioastronomia

“Ora (direis) ouvir estrelas! Certo
Perdeste o senso”! E eu vos direi, no entanto,
Que, para ouvi-las, muita vez desperto
E abro as janelas, pálido de espanto…

E conversamos toda a noite, enquanto
A via láctea, como um pálio aberto,
Cintila. E, ao vir do sol, saudoso e em pranto,
Inda as procuro pelo céu deserto.

Direis agora! “Tresloucado amigo!
Que conversas com elas? Que sentido
Tem o que dizem, quando estão contigo?”

E eu vos direi: “Amai para entendê-las:
Pois só quem ama pode ter ouvido
Capaz de ouvir e de entender estrelas”. Olavo Billac

Olá!!! Na nossa imaginação criamos uma representação para o Universo… Uma imagem única… Construída a partir de informações coletadas pelos nossos sentidos… Visão… Audição.. Olfato… Tato… Paladar… O cérebro, o centro de processamento dessas informações… Em um passado não muito distante, as representações de nosso mundo foram limitadas pelo alcance dos nossos sentidos… Existe um Universo diferente do que sentimos??? Uma dúvida existencial permanentemente presente nas almas das gentes

Com o auxílio de um instrumento de observação, extensão de nosso olho, Galileu Galilei, iniciou o descortinamento de um novo firmamento. Em 1610 publicou dados relativos as suas primeiras observações. Imagens desconhecidas pelos nossos sentidos. Instrumentos mais precisos foram permitindo à humanidade vislumbrar um Universo desconhecido. Telescópios, escadas para nos auxiliar a tocar as estrelas. Metáforas para poetas. Suporte científico para cientistas criativos e sonhadores.

Apesar desse auxílio, continuávamos limitados a observar o Universo dentro da faixa do espectro eletromagnético que a nossa retina é sensível. Em 1932, uma grande surpresa. O físico norte-americano Karl Guthe Jansky anunciou na “Proceedings of the IRE” que havia detectado ondas de rádio cuja fonte estava localizada no centro da nossa galáxia, a Via-Láctea. Primeira detecção de um sinal não visível com fonte extraterrestre. Início da Radioastronomia!!! Ele havia sido contratado em 1928 pela Bell Telephone Laboratories para investigar as fontes de interferência na recepção de sinais transmitidos pelas estações de rádio, terrestres, é bom que se diga… Desde 1931 havia percebido que um dos sinais detectados, e que interferiam na recepção, tinha uma fonte que parecia não estar em nosso planeta… Uma análise mais detalhada o  permitiu confirmar as suspeitas iniciais. A fonte da emissão estava localizada no centro da nossa galáxia!!! Descoberta feita por acaso…

Em 1937, Grote Rober, motivado após ter lido o anúncio da descoberta, construiu um radiotelescópio no jardim de sua casa. Realizou a primeira sequência de registros sistemáticos de sinais extraterrestres e confirmou a descoberta feita por Jansky. A partir desse momento temos o início da construção de gigantescos radiotelescópios. Registro de dados de um Universo desconhecido pelos nossos sentidos.

Em 1967, Susan Jocelyn Bell-Burnell, estudante de pós-graduação da Universidade de Cambridge, realizou a detecção de sinais extraterrestres periódicos e com uma alta frequência. Não tendo uma fonte visível, chegou a se especular na época que poderiam ser sinais emitidos por seres extraterrestres. LGM, little green men, pequenos homens verdes. Ela e seu orientador Anthony Hewish publicaram um trabalho sobre essa detecção. A fonte dos sinais é um tipo de astro conhecido como estrela de nêutrons, também chamado de pulsar. Foi a primeira vez que haviam sido detectados, já que não era possível observá-los na faixa do visível. Por essa descoberta o seu orientador recebeu o Prêmio Nobel em 1974. Uma das grandes injustiças da ciência foi a não premiação de Jocelyn Bell.

O PhD em Física, Kent Cullers, é deficiente visual. Foi o primeiro deficiente visual a se formar em Física. Obteve o seu doutorado em 1980. Atualmente trabalha no projeto SETI. Projeto que analisa os sinais detectados pelos radiotelescópios em busca de vida extraterrestre.  Ele não conta com o auxílio da visão, fato que não o impediu de perscrutar o Universo e tentar compreendê-lo. Ouve o som das estrelas. Fonte para uma sinfonia que ele está compondo usando a sensibilidade de sua alma. No silêncio da ausência de imagens, imagina um Universo melodioso, colorido pela esperança, e justo. Ultrapassando todos os obstáculos se transformou em um exemplo para a humanidade…

Gostaria de compartilhar com todos a minha esperança de que o exemplo de Kent Cullers e de outras maravilhosas gentes nos estimulem a desenvolver com mais motivação atividades de ensino e divulgação da Astronomia e da Astronáutica.

Um fraterno abraço.

Céu limpo para todos.

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